quarta-feira, abril 25, 2007

Lute pelo que é seu! Não 'a CPMF

OPORTUNIDADE ÚNICA

A CPMF, contribuição criada para ser provisória, é agora objeto de uma espécie de canonização, devendo tornar-se definitiva, como se a eternidade fosse o seu destino. O perigo é maior do que nunca, porque o governo conseguiu uma ampla aliança em torno de si, distribuindo cargos e privilégios, como se a coisa pública pudesse ser fatiada segundo o seu arbítrio. Agora, pede-se aos parlamentares contemplados que aprovem os recursos que possam satisfazer os privilégios dos aquinhoados. Satisfeitos, eles se sentariam, então, em torno de uma única mesa para comemorar. Os próprios governadores se apressam a participar dessa ceia, pedindo para eles um naco desses recursos, para que também participem e fiquem contentes.

Contribuições, impostos e taxas são nada mais do que apropriações da propriedade privada alheia, transferida para o Estado, que guarda o monopólio de sua distribuição, como se soubesse melhor do que ninguém utilizar os recursos dos outros. Pergunte a uma dona de casa se ela preferiria ter mais alimentos em sua mesa ou pagar mais impostos. Essa pergunta, porém, não lhe é dirigida, porque desnudaria os propósitos do governo e o obrigaria a prestar contas daquilo que faz. Como explicaria ele o banquete que faz com os seus impostos? Ainda hoje, no entanto, paira na mente de muitos que a CPMF tem como destinação única a saúde, quando, na verdade, em sua maior parte, é dedicada a pagar a dívida pública e a cobrir os rombos (e roubos) previdenciários.

Subjaz a essa atitude governamental a idéia de que cabe ao Estado redistribuir a riqueza, e não ajudar a criá-la. Na proposta do ministro Guido Mantega, de isentar os empréstimos dessa contribuição, está presente a idéia de que ele deve favorecer alguns. Na verdade, está fazendo uma benesse com os recursos alheios, colocando-se como um benfeitor. Uma alternativa, que favoreceria todos, inclusive os mais humildes, consistiria numa redução uniforme da CPMF, digamos, correspondente à redução estimada de R$ 4 bilhões.

A lei que instituiu a CPMF é o que poderíamos qualificar de uma “má lei”, tendo como objetivo diminuir o âmbito de escolha das pessoas e reduzir a capacidade de investimento das empresas, tornando o Estado ainda mais forte. O argumento, pueril, de que os que se recusam a votar pela continuação dessa contribuição deveriam indicar fontes alternativas de recursos equivale a exigir de um chefe de família a aquiescência para que reduza as suas despesas a fim de financiar o governo. Este vai apropriar-se do seu dinheiro, porque está sempre inflando os seus gastos. A resposta simples seria: basta gastar menos, assumindo as responsabilidades de corte e/ou de não-criação de novas fontes de despesas. Gastar o dinheiro alheio e pedir que o outro ainda preste contas se tornou moeda corrente.

Engendra-se todo um sistema burocrático que torna o Estado o provedor e o favorecedor de benefícios, como se tivesse o poder e a sabedoria para exercer tais funções. O poder ele o detém pelo uso virtual da força; a sabedoria, não, pelas distorções e disfuncionamentos que ocasiona. A sociedade torna-se cada vez mais burocratizada e menos propensa ao desenvolvimento do empreendedorismo e da liberdade de escolha. A economia de mercado fica truncada. O lado particularmente perverso da tradição redistributiva consiste em criar uma teia de privilégios que enreda a totalidade dos cidadãos. Os privilégios são uma espécie de propriedade deformada, que se torna objeto de ações políticas e administrativas.

O Estado dita as regras do jogo e distribui as cartas, fazendo com que a disputa pelos privilégios se torne o alvo de sindicatos, grupos empresariais e corporações privadas e públicas, dentre eles os mais fortes, excluindo os demais desse processo de disputa pela apropriação dessa fatia dos privilégios. A política vê-se, assim, reduzida a uma disputa por cargos (que dão acesso aos privilégios) e dos privilégios propriamente ditos, como esses decorrentes da CPMF. A essa perversidade se acrescenta ainda uma outra, a de que alguns participantes desse jogo se apresentam como representantes da justiça social, como se representassem pretensões universais, quando, na verdade, nada mais fazem do que conservar e conquistar posições particulares, privilegiadas.

Reina no Brasil um pesado sistema tributário e uma detalhista administração, baseados em imposições à propriedade privada por um Estado que muito promete, pouco atende e continua crescendo. A luta por cargos na dita reforma ministerial ou na briga de prefeitos e governadores por maiores fatias do bolo tributário, assim como de parte da União em guardar os seus privilégios, é a dos que voltam as costas para a sociedade. Em nenhum momento é cogitado oferecer-lhe menos tributos. Pede-se apenas que contemple o festim feito com os seus recursos ou coma as migalhas que caem da mesa. Os que não têm força para entrar nessa disputa corporativo-administrativa estão excluídos, sejam eles grupos empresariais, a classe média, os trabalhadores ou os excluídos do sistema legal de propriedade. A luta pelos privilégios caracteriza a ação política, tendo como resultado um Estado centralizado e altamente burocrático, com as distorções inerentes a uma oligarquia que domina toda a sociedade, as chamadas elites, sejam elas ditas de esquerda ou de direita. Os privilégios tomam a forma de propriedades “adquiridas” pelos que detêm posições de poder. Não é, pois, de estranhar que nesse tipo de Estado grassem a corrupção, as negociatas e as mais diferentes barganhas, porque podem elas aí florescer livremente.

Não perca a oportunidade, diga não à CPMF. Outra chance dessas só se apresentará dentro de quatro, oito ou quem sabe o número de anos.

Lute pelo que é seu!
Denis Rosenfield

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